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ARTificial.

ARTificial

Por Mônica Bonna.

Olá, humanas! Espero que estejam bem.  Eu as saúdo de volta, depois de um período de recesso, com um tema intrigante e perturbador para a classe artística mundial,  sobretudo quando se trata da (in)disponibilidade de trabalhos artísticos.

Afunilando nossa conversa, visando focar na arte brasileira – pretendo abordar temas que vêm ganhando espaço e soterrando a arte como forma de expressão pura e genuína dos aspectos da humanidade.

Há anos nós, artistas brasileiros, temos enfrentado certa dificuldade em encontrar nosso espaço como difusores e mantenedores de nossa arte. Vemos nosso ofício se transformando em algo sem valor e nossos anos de estudo, suor e lágrimas sendo reduzidos ao pó, em troca de uma arte artificial.

Não me considero, em essência, uma pessoa conservadora, tampouco viso invalidar a contribuição da tecnologia na arte. Tendo estudado e trabalhado anos como analista de tecnologia, desenvolvedora de sistemas e gerenciadora de servidores em datacenter, sou capaz de reconhecer a importância da evolução tecnológica para a humanidade. Entretanto, existe uma linha tênue, que se apresenta como uma corda bamba, na qual a arte insiste em atravessar, vendada sobre um monociclo.

De um lado, nos deparamos com castings de publicidade à procura de “pessoas reais” (termo utilizado para designar profissionais de diversas áreas, não-atores) e tantos outros castings que vemos, buscando pessoas influentes em redes sociais para compor elenco de grandes peças musicais e teatros de prosa. Pessoas que, em sua maioria, não dedicaram suas vidas ao estudo da arte de atuar / cantar / dançar, em papeis de atores, cantores e performers.

Do outro lado, o avanço da inteligência artificial ganha espaço, preenchendo lacunas artísticas, antes inteiramente suportadas por atores, roteiristas, coreógrafos e etc. Peças ao redor do mundo estão usando robôs humanoides em cena, no lugar de artistas. Roteiros teatrais inteiramente criados artificialmente. 

No Brasil, o procedimento para a obtenção do registro profissional de atores, dançarinos e técnicos de espetáculos (DRT), assim como de músicos, instrumentistas e maestros (OMB), exige avaliação e comprovação teórica e prática do estudo artístico e é suportado por lei. 

A título de embasamento, trago aqui informações oficiais do sindicato sobre a legislação vigente.

“O DRT, que significa “Delegacia Regional do Trabalho”, é um registro profissional vital para trabalhadores das categorias especificadas na Lei nº 6.533/78. Esse registro é emitido pela Delegacia Regional de Trabalho, uma entidade responsável pela regulamentação e fiscalização das profissões no setor de espetáculos e diversões. Conforme os artigos 6 e 7 da lei, os profissionais que desempenham funções descritas na legislação devem obter e manter esse registro para atuar legalmente. O DRT, portanto, é crucial para assegurar que os trabalhadores estejam devidamente qualificados e em conformidade com as normas estabelecidas, sendo representados pelo SATED SP para garantir seus direitos e deveres.” *https://satedsp.org.br/index.php/como-funciona-drt-registro-profissional/)

Requisitos para obtenção do registro profissional de atores:

  1. A primeira fase da avaliação é a verificação dos documentos comprobatórios apresentados e histórico preenchido demonstrando composição da carga horária de 1400 horas de atividades diversificadas (Conforme tabela B), práticas e teóricas ministradas por profissionais devidamente registrados na DRT ou órgão competente. As atividades/ experiências formativas devem atender aos itens dispostos na grade curricular da normativa. 2. Portfólio em ordem cronológica de todos os trabalhos exercidos na função. Prova de escolaridade (certificado de conclusão do ensino fundamental (1o grau) ou do ensino médio (2o grau) conforme a função, para maiores de 16 anos, ou declaração oficial da escola.); 3.Provas documentais de exercício da função até a presente data, através de: Contratos de trabalho assinados com a função , comprovantes de trabalhos, recibos, materiais de divulgação dos espetáculos, carta da empresa com papel timbrado assinado com o serviço prestado com a função , fotos, matérias na imprensa etc.), comprovantes de cursos , oficinas e/ ou workshops com a carga horária correspondente, cursos acima de 200 horas com grade curricular , bem como o registro profissional do profissional ministrante; (https://satedsp.org.br/index.php/profissoes-ator/).

Apesar de, aparentemente, protegidos pela lei, é evidente que nós – artistas – temos sido lesados constantemente pela falta de cumprimento da mesma. A lei é parcial e a justiça tem olhos atentos apenas ao que gera lucro. A fiscalização da competência profissional não usa os mesmos critérios rigorosos que encontramos em outras profissões. Médicos não podem exercer sua função se não apresentarem o CRM, nem advogados, a OAB. Entretanto, ao se tratar da arte, a lei é suprimida.  (Me pergunto: as pessoas aceitariam, de bom grado, que suas doenças fossem tratadas por pessoas sem estudo e capacidade comprovada?)

A arte está em tudo e em todos e é dona de si própria. Porém, devido a sua subjetividade, limites fundamentais têm sido ultrapassados no âmbito profissional.

Enquanto essa questão marina, vamos voltar a falar do impacto da inteligência artificial na arte.

Disponibilizo algumas definições:

  • Tecnologia, segundo o dicionário Oxford é: 1. teoria geral e/ou estudo sistemático sobre técnicas, processos, métodos, meios e instrumentos de um ou mais ofícios ou domínios da atividade humana (p.ex., indústria, ciência etc.). 2. figurado – técnica ou conjunto de técnicas de um domínio particular. (p. ex., “a t. nutricional”).

 

        * Inteligência artificial (Visão geral criada por IA): 1. é a capacidade de máquinas simularem a inteligência humana, permitindo que elas realizem tarefas que requerem funções cognitivas. 2.  é um campo da ciência da computação que desenvolve algoritmos e sistemas que podem aprender, raciocinar, planejar e criar. (…) A IA funciona de forma a receber dados, processá-los e responder. Os sistemas de IA podem adaptar o seu comportamento com base na análise dos efeitos das ações anteriores. A IA se baseia em três pilares: Dados (Informações coletadas e organizadas para automatizar tarefas), Hardware (Poder de computação para processar dados) e Software (Conjunto de instruções e cálculos para treinar sistemas).

Ao atuar, para além de decorar falas e marcações cênicas, deve existir uma compreensão dos motivos internos das personagens, suas memórias afetivas, gostos, hobbies, preferências, segredos escondidos… (entre tantas outras questões que artistas dedicam sua vida a estudar e aperfeiçoar). 

A arte sendo a expressão mais genuína da vida e das relações humanas, pode/deve ser substituída por regimes binários? Sinto que estamos de volta à caverna de platão. Tudo o que enxergamos são sombras. Se estivéssemos em Oz, seria a IA o formidável mágico que consegue responder a todas as questões? 

Termino essa matéria com um sentimento agridoce. Enquanto marcas bancam uma realidade superficial – e ignoram completamente o fato de que nós, artistas não amadores, somos, primeiramente, pessoas reais que dedicam sua vida ao desenvolvimento artístico, e a tecnologia apresenta a realidade artificial – visando lucro em detrimento da complexidade emocional e psicológica dos seres humanos… A arte cambaleia.

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Momô.

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