Search
Close this search box.

  O casamento como instituição civilizatória no Brasil oitocentista.

    Medicina- ‘ A ideologia higienista’ do Brasil oitocentista sobre o corpo e a moral feminina.

Por Alíne Valencio.

Deusa,

Essa é a primeira matéria de 2025, a primeira de muitas que pretendo escrever nessa coluna ao longo do ano. Porém, antes faço questão de desejar à você a mais transformadora libertação. A mais imensa certeza de quem você é de verdade e a mais incrível serenidade e coragem para se manter firme nos seus propósitos diante do massacre social conservador que nos assola. Que em 2025 você finalmente pare de se submeter e de se sujeitar à crenças retrógradas das quais você tem vivido à sombra. Quero ver as mulheres brilhando. Todas. T- O-D-A-S.

A matéria de hoje é interessantíssima e ao mesmo tempo fundamental como mais um pilar de entendimento e consciência de libertação feminina. Musa poderosa, o assunto de hoje se debruça na abordagem médica sobre o casamento e a moral feminina no Brasil do século XIX e como os médicos se configuravam, de certa forma, autoridades que promoviam e influenciavam as normas sociais e morais a respeito do casamento e mais especificamente sobre o corpo feminino. Sim, minha amiga, mais uma vez, nossos corpos foram adestrados por supostos e fabricados conceitos biológicos, que se embasavam na ciência para nos calar.

No Brasil oitocentista, a visão da medicina se voltava para o papel da mulher no matrimônio e ao estabelecimento de preceitos higiênicos para a contração do matrimônio de modo considerado civilizado. Perceba que, para a sociedade do século XIX no Brasil, o casamento era o único meio civilizador de uma mulher. Você compreende perfeitamente o que isso quer dizer né? Uma mulher solteira era sinônimo de louca. O casamento configurava-se a única instituição e situação possível para uma que uma sociedade se tornasse viável. Qualquer outra condição não era aceita. E nem preciso dizer que a mulher era o pilar oprimido nessa engrenagem né?

Naquela época a ótica médica inclinava-se não apenas em questões relacionadas ás questões fisiológicas dos seres humanos, como também tangenciavam o espectro da moralidade. Só de pensar nisso já me cansa. Quanto mais levará para nos deixarem em paz? O que era considerada moral naquela época? CASAMENTO. Nada mais! Inclusive a ciência médica tinha autoridade para determinar quais mulheres eram aptas a casar por conta de suas ‘ancas’, citando até mesmo a largura da bacia adequada para ter filhos. Mas, o que mais causa engodo é o fato de que qualquer possibilidade de considerar a capacidade subjetiva e intelectual das mulheres era totalmente sublimada e calada, já que a as representações de gênero e sexualidade nas teses médicas oitocentistas limitavam- se à esfera biológica, isto é, ao ato sexual. O que mais me assusta é que essa premissa ainda é empregada na sociedade. Nos meus atendimentos particulares de sexualidade sagrada feminina, a primeira pergunta que eu faço para as mulheres é: “O que é sexualidade para você”? E adivinhem qual resposta eu ouço em 99% das vezes? “É sexo”. Fico paralisada porque ao restringir dessa maneira rasa a sexualidade, reduz-se por consequência a capacidade humana de ser feliz e prosperar, porque é sabido que abundância está diretamente ligada ao conhecimento profundo de si mesmo. E isso é sexualidade em sua mais profunda essência. E apenas o que se considerava é que o ato sexual era entendido como necessidade básica para a procriação.

A violência era tão catastrófica que somente mulheres cuja vagina possuísse condições consideradas normais poderiam casar. Acredite se quiser. As outras teriam seu casamento anulado. Eu fico aqui imaginando o quanto essas mulheres eram expostas, já que é bem provável que essa condição “anormal” fosse ostentada para a família, para a igreja e para a sociedade. Resumindo, era definitivamente uma sentença. Todo mundo ficava sabendo que a vagina “inadequada” de determinada mulher a rebaixava à condição de marginalidade. Revoltante né?  As mulheres inadequadas eram aquelas que tinham a “falta de vagina e a inperfuração da vulva”, “a existência de vagina, porém inteiramente imperfurada”, “a terminação da vagina em fundo de saco ou ausência do útero” e por último a queda irredutível e considerável da vagina ou do útero. Minha querida, você já parou para refletir que até hoje há, de maneira inconsciente, um reflexo desse pensamento arcaico? Quando uma mulher busca por cirurgias para “padronização da vagina” ela está indiretamente repetindo comportamentos instituídos, concorda?

Por qual razão uma mulher quer ter uma vagina padronizada? Para atender à expectativa machista de homens que se acham entendendores de corpos femininos e elas buscam se diminuir para serem aceitas. Isso é produto do adestramento da sexualidade feminina e da sublimação da capacidade subjetiva e intelectual das mulheres que há milênios vem sendo subjugadas. Além de que esse enfoque exclusivamente biológico sobre nossos corpos não somente limitava a autonomia e o desejo das mulheres, como reforçava a autoridade médica na regulamentação das nossas vidas pessoais e matrimoniais. Fica claro, dessa forma, como a medicina exercia controle sobre o comportamento e as escolhas das mulheres no século XIX.

Será que é mesmo só no século XIX que a medicina exercia controle sobre nossos corpos? Pare para pensar que quando vamos ao ginecologista por exemplo, a primeira coisa que o médico faz é determinar como devemos olhar para o nosso corpo a partir de uma premissa determinista e padronizada, como se todos os corpos femininos reagissem da mesma forma. Está vendo como ainda em 2025 nossa sociedade está repleta de comportamentos inconscientes coletivos que repetimos sem nem mesmo nos darmos conta? Por isso, o objetivo dessa coluna é te inspirar a questionar tudo que nos foi ensinado a respeito do nosso corpo e que você viva da maneira que considera melhor para você independente do que os outros determinaram para você.

A medicina da época refletia essas normas culturais e, de maneira autoritária enfatizavam a importância da educação limitada, cuja premissa era a castidade sexual, em especial da mulher e do casamento como forma de manter a moralidade e a honra das mulheres na sociedade, pois delas era esperada a submissão e a castidade, para que desempenhassem papéis tradicionais de esposas e mães. A moralidade feminina interessava aos intelectuais , em sua maioria homens (claro) que defendiam  uma ideologia higienista e nacionalista que emergia na sociedade brasileira na segunda metade do século XIX.

O estado de “não casada” era considerada uma violação dos impulsos da natureza, sendo, obviamente mais penoso para a mulher do que ao homem, uma vez que essa condição determina o destino natural das mulheres ao matrimônio. E mais, necessidade da afirmação de que à mulher é preciso admitir como verdade inexorável o fato de que a mulher é dominada pela necessidade de união, e o homem pelo desejo do gozo.

Em suma, esta matéria está chegando ao fim, mas eu quero enfatizar e te instigar a refletir em torno da problemática de que sempre foi tirado de nós mulheres o direito de sermos donas do nosso desejo, do nosso gozo, da nossa vagina, da nossa vontade e que isso é apenas um reflexo indiscutível de séculos de doutrinação e colonização da sexualidade da mulher. Por isso, em nome da liberdade da alma e da revolução sexual da mulher, eu, como sua eterna parceira ficaria imensamente satisfeita acreditando que minhas matérias transformam vidas, se você começasse a buscar a sua liberdade em todos os âmbitos da vida sem permitir que ninguém determine como você deve viver. Mas, principalmente e mais importante, que você não se sinta mal por isso. Ao contrário, que a soberania das suas decisões te traga a coragem de continuar sendo quem é mesmo diante do massacre que se abaterá sobre você quando decidir priorizar suas vontades e desejos.

Nesse ano que se inicia, compreenda de uma vez por todas que sua única responsabilidade é com a sua felicidade e isso não é egoísmo, e que isso é libertador para todos, tanto para quem você tenta agradar, quanto para você.

Acredite e pratique isso na sua vida e você verá sua vida prosperar de maneira inacreditável.

Com amor,

Anúncio
Anuncio305x404

Alíne Valencio.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *