O Santuário de Afrodite.
Por Alíne Valencio.
Musa maravilhosa,
Mais uma sexta feira está chegando ao fim e aqui está um lindo sol de fim de tarde. Sabe esses dias lindos de verão com um sol radiante? Tudo bem, eu sei que não estamos no verão, mas parece. E o por do sol é inspirador e nostálgico não é mesmo? E, contemplando o entardecer, deixei o sol cruzar meu rosto, respirei fundo e acabei me recordando que hoje é a última série de matérias acerca da contextualização histórica e social do corpo feminino ao longo da história, tendo como embasamento o livro: “Nos Submundos da Antiguidade”, de Catherine Salles. Sim, foram diversas matérias onde dispus um conteúdo inusitado, do qual não se fala na escola. Nem tampouco alhures.
O intuito de toda essa série é instigar as mulheres a ir em busca de compreender a realidade que nos cerca no que diz respeito a ser mulher nos dias de hoje e toda a sorte de situações e circunstâncias sociais e morais que envolvem o corpo feminino no decorrer da história da humanidade. Foram assuntos que nos causaram desde engodo, repulsa e todo o tipo de sentimentos diante do que foi relatado não é mesmo? Como você encarou tudo que leu aqui? Espero que tenha virado uma grande chave para você a ponto de começar a questionar as coisas que dizem para você.
Então, agora vamos, finalmente ao assunto da matéria de hoje. Como você já percebeu minha coluna não é nada convencional (graças a Deus) e sendo assim gostaria de pedir com todo amor que ao ler esse conteúdo, você desapegue de dogmas religiosos, morais e pré-conceitos incutidos. Você consegue. E eu sei que, provavelmente, dependendo da maneira como você enxerga determinadas situações, esse simples fato de desconsiderar todos os ensinamentos de uma vida inteira já te causa arrepios. Mas, já te aviso de antemão que é normal isso acontecer quando nos deparamos com questionamentos que desestabilizam tudo que acreditamos como verdade.
Segundo o livro, havia um fenômeno da antiguidade que excitou a imaginação das antigas civilizações. Era a prostituição sagrada. Na verdade, há muito pouca informação a respeito do intuito e dos objetivos de tal fenômeno. Inclusive afirma-se que embora esse costume esteja perfeitamente interligado na vida de certas cidades gregas, como Corinto, não pertence propriamente à civilização helênica e corresponde a uma concepção da divindade de origem estrangeira. O que se sabe é que era uma maneira de oferenda às Deusas. Eram cultos prestados à divindades femininas, assimiladas mais tarde à Afrodite.
Não se sabe com profundidade as verdadeiras intenções dessa prática, contudo as motivações mudam segundo os povos. Até porque as explicações eram por demais fantasiastas. Veja esse trecho do livro ( pág. 33): “Os Armênios veneram particularmente Anaitis (ou Anahita) e lhe construíram numerosos templos, sobretudo em Aquilinese. Eles lhe consagram rapazes e moças escravos. E o mais surpreendente é o fato de que os homens mais eminentes do país consagram suas filhas ainda virgens: a lei determina que elas se entreguem à prostituição durante muito tempo, em benefício da Deusa, antes de serem dadas em casamento; e ninguém julga uma indignidade casar com elas depois”.
Fonte: instagram @vaigna_museum
Em outras localizações como na Líbia por exemplo, as moças juntavam seus dotes do mesmo modo. E tem mais, entre outros povos, as cortesãs sagradas fazem parte do “Clero” permanente da divindade e exercem durante toda a vida, sua profissão nas cercanias do templo da deusa, a quem cabem as somas de dinheiro dadas pelos “fieis”. Essa forma particular de culto à Afrodite em Corinto (cidade Grega) ou na Ilha de Chipre explica-se pelas influências orientais que eram bastante intensas nessas regiões.
Veja este outro trecho interessantíssimo:
“O Santuário de Afrodite era tão rico que possuía mais de mil prostitutas sagradas, oferecidas à Deusa por homens e mulheres. Por causa delas, a cidade era muito povoada e se enriquecia consideravelmente, pois os donos dos navios nela se arruinavam facilmente: por isso surgiu a célebre frase: Não é permitido a qualquer um aportar em Corinto”.
A notoriedade dessas escravas sagradas era muito grande em todo o mundo antigo, e elas eram oferecidas à Deusa por seus devotos. Mas afinal, elas eram prostitutas ou sacerdotisas? Bem, as duas funções são estritamente ligadas. Lembram que eu mencionei em uma matérias atrás que as prostitutas eram sagradas, e que tinham direta ligação com Deus? As sacerdotisas também. Tanto é que tal como as outras sacerdotisas do mundo grego , elas participavam oficialmente de todas as cerimônias onde sua intervenção “sagrada” é necessária. Essa intervenção das prostitutas sagradas e sacerdotisas era tão poderosa que quando os Persas invadiram a Grécia pediu-se às cortesãs do templo de Afrodite que fizessem orações públicas e oferecessem um sacrifício pela salvação dos gregos. E tendo suas orações sido aparentemente eficazes, já que o exército e a frota de Xerxes foram definitivamente derrotadas pela coalizão das cidades gregas, os coríntios colocaram no templo de Afrodite um ex-voto, estátuas e a lista de todas as prostitutas, inspiradoras da vitória.
Logo, episódios como esse são excelentes provas de como as hieródulas (prostitutas sagradas) ocupavam um lugar respeitado no mundo grego. E esse fato permite compreender melhor a atitude contraditória que os antigos sempre tiveram em face da prostituição.
Amiga, musa maravilhosa. Você compreende, diante de todo esse relato, como a sexualidade é a força mais poderosa que existe? Em especial a sexualidade feminina? Percebeu que a oração de mulheres consideradas “profanas” teve o poder de decidir o rumo de uma guerra? Inclusive, aproveito para citar aqui mais uma prova disso. Você conhece a obra Lisístrata? É uma comédia grega , de autoria de Aristófanes. A peça conta a história de Lísistrata, que, como as outras mulheres da cidade, estavam cansadas da guerra e resolveram fazer greve de sexo até que os homens instituíssem a paz definitivamente. Adivinha o que aconteceu? A guerra cessou. Estou citando essa peça, para reforçar meu posicionamento. Posso citar mais uma obra para te instigar a repensar seus conceitos a respeito da sexualidade além daqueles paradigmas arraigados no nosso inconsciente. Você já ouviu falar de Wilhelm Reich? Ele era um psiquiatra e sexologista americano- austríaco que escreveu a obra “A Revolução Sexual”. Esse livro relata as análises dos atendimentos de seus pacientes. Depois de muitos anos, ele constatou que os grandes conflitos humanos que geravam as mais desastrosas guerras e fenômenos absurdamente violentos e grotescos era a relação mal resolvida de seus pacientes com a sua própria sexualidade. Segundo Reich, se as pessoas tivessem contato verdadeiramente íntimo e leal com sua sexualidade a humanidade viveria em paz. As mais violentas disputas da humanidade são aquelas relacionadas ao ego, poder e dinheiro e são resultado de uma sexualidade equivocada e inexistente.
Dessa forma, minha deusa, está mais do que claro que a sexualidade move o mundo, ela é soberana na construção de uma sociedade de paz e de amor, pois não há amor maior do que aquele que praticamos para conosco antes de qualquer outro. E sim, o amor que move o mundo perpassa pelo amor sexual que praticamos conosco. E digam o que quiserem, berrem, bradem, briguem, esperneiem e me chamem de herege, mas nada me convence do contrário. Ao invés disso, tenho cada vez mais convicção do quanto a sexualidade é sagrada e abençoada por Deus. E mais, é um dos principais pilares que mantém a vida no universo, dado que a energia sexual é energia vital. Ou seja, sem energia vital a gente morre. Simples assim. Estou certa de que depois dessa nossa conversa não é necessário continuar argumentando mais nada. Portanto, musa, reflita sobre tudo que conversamos aqui e questione seus próprios conceitos preconcebidos a respeito da sexualidade. Eu, amaria conversar com você sobre o assunto. Se sinta à vontade para me enviar mensagem.
Com todo amor,
Alíne.